Às vezes, eu acho que, de tanto falarmos do 5G, a maioria das pessoas o percebe mais pelas notícias do que exatamente pelo uso da tecnologia em si. Ontem mesmo passei por uma situação clássica: falta de energia e a necessidade de seguir conectado trabalhando.
Se não fosse a limitação de bateria do notebook e do celular, a experiência de conectividade que o 5G me proporcionou ao alternar do link de banda larga “morto” para ele, eu teria trabalhado normalmente, trabalhando com arquivos online e fazendo as minhas videoconferências de sempre.
Isso é ótimo porque comprovamos na prática que o 5G entrega o que promete: baixa latência, uma velocidade muito superior ao 4G (até 100 vezes) e uma ótima densidade de equipamentos conectados por km2. Imagine só o que acontece quando a energia / internet banda larga de uma região caem: todo mundo alterna para a rede celular e ela hoje em dia está pronta para aguentar.
Este episódio de falta de energia me fez pensar no comportamento do consumo energético das redes celulares. Obviamente, ontem, o site que mantinha o sinal de 5G irradiando estava suportado por um gerador enquanto estávamos sem energia. Mas, olhando para o consumo de energia, qual é o comportamento do 5G?
O Paradoxo da Conectividade.
As redes 5G nos apresentam um paradoxo bastante interessante: se pelo lado técnico da construção da tecnologia a promessa é de mais eficiência energética por bit transmitido, por outro lado, como temos uma rede muito mais eficiente, espera-se um volume de dados muito maior sendo transmitido por mais dispositivos conectados simultaneamente e isso pode resultar em um consumo de energia maior quando fechamos a equação.
Muito cuidado aqui, pois o impacto no consumo exato de energia pode variar significativamente dependendo da geografia e perfil de urbanização do local, da implementação, da disponibilidade de infraestrutura e da tecnologia específica utilizada. Então, sem colocar números, vamos elaborar um pouco mais os principais fatores que podem influenciar no consumo:
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Densidade de Antenas: como o 5G usa frequências mais altas, ele requer mais antenas para cobrir a mesma área do que as tecnologias anteriores que estão em faixas menores. Estima-se que seriam 5 a 10 vezes mais antenas, dependendo de cada caso. Isso faz com que cada antena extra seja um novo ponto de consumo de energia. Mais células também exigirão uma rede mais ramificada de transmissão, o que também contribui para o aumento na demanda por energia.
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Processamento de Dados: o aumento no volume de processamento de dados proporcionado pelo aumento da velocidade pode ser observado, por exemplo, nos planos de consumo de dados. Se até pouco tempo atrás tínhamos planos de 1 ou 2Gbps, hoje é comum termos planos de 20 a 50 Gbps por mês. Mais dados na ponta significa mais processamento, que exige um poder computacional maior ainda. Essa necessidade de poder computacional pode ser percebida pelas notícias de mais datacenters sendo construídos a todo momento.
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Resfriamento: a conta aqui é direta, processando esse volume crescente de dados, os equipamentos dessa cadeia gerarão mais calor, o que demanda mais resfriamento. Um controle térmico mais intenso demanda consumo energético.
Impacto Ambiental
O aumento no consumo de dados via 5G pode ser um ofensor direto na sustentabilidade ambiental. Com o crescimento da cobertura e a implantação incremental de equipamentos de rede, e o lançamento contínuo de novos aparelhos celulares, a demanda por minerais raros na fabricação de equipamentos é cada vez maior.
Por outro lado, a maior necessidade de refrigeração que falamos traz, além de uma demanda energética maior, também impacta no consumo de água para refrigeração de datacenters. Países com matriz energética que depende de combustíveis fósseis e escassez hídrica têm um impacto maior. Falamos um pouco desses temas nos artigos anteriores sobre datacenters:
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Datacenter como um Ecossistema Vivo: O Caminho para a Sustentabilidade Digital
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Por que Edge Computing e 5G São as Novas Fronteiras dos Datacenters?
Mas, como um otimista nato, vou contrapor o rumo dessa prosa e trazer um pouco de positividade para o tema. Segundo o relatório “Mobile Net Zero: State of the Industry on Climate Action 2023” da GSMA o setor móvel é responsável por 0,4% das emissões globais de carbono. Mas, o mesmo relatório diz que essas mesmas redes móveis têm um potencial que permite reduções de carbono nos setores produtivos da economia cerca de 10 vezes maiores que as suas próprias emissões.
No mercado de telecomunicações, há uma preocupação crescente com a sustentabilidade da conectividade e cada vez mais vemos operadoras móveis divulgando seus indicadores de emissões climáticas, se comprometendo a reduzi-las e até metas para zero emissões líquidas.
O ponto desse artigo nunca foi condenar o 5G e o aumento da geração e processamento de dados que ele habilita, e sim chamar a atenção para maneiras que podemos trabalhar para mitigar o impacto ambiental.
Alguns fatores, quando observados, podem alterar o impacto real no consumo energético, mineral e de recursos hídricos:
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Arquitetura de rede escolhida.
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Programa contínuo de otimização de rede (Uso de IA).
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Incentivo ao compartilhamento de rede.
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Implantação de tecnologias de eficiência energética.
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Desenvolvimento de tecnologias cada vez mais sustentáveis.
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Volume de tráfego de dados (Edge Computing vs Datacenters Centralizados).
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Matriz energética verde e local.
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Práticas de economia circular.
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Compromissos de emissão zero de carbono.
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Casos de uso nos setores produtivos que resultem na economia de recursos naturais.
Equilibrar o consumo energético do 5G é um grande desafio, mas não intransponível. A combinação de inovação e programas de sustentabilidade podem criar um caminho viável para a sustentabilidade da conectividade. O sucesso dessas iniciativas depende do engajamento dos stakeholders: fabricantes, operadoras, governos, grandes clientes corporativos e nós, usuários.
E você: concorda com a ideia de que podemos ter um futuro mais conectado, rápido, inteligente e verde?
Sou Mauro Periquito, Engenheiro de Telecomunicações e Diretor Especialista de Prática na Kyndryl, onde desenvolvo e gerencio projetos de transformação digital para indústria, utilities, mineração, agronegócio e operadoras de telecomunicações. Em minha trajetória profissional, tenho como propósito traduzir as necessidades dos clientes em soluções customizadas.
Também atuo em outras frentes como mentor, palestrante, conselheiro consultivo e escrevo diariamente no LinkedIn sobre gestão de pessoas, carreira, inovação e tecnologia, com a missão de trazer uma visão descomplicada sobre a tecnologia. Fui eleito no final de 2022 como LinkedIn Top Voice de Tecnologia & Inovação.
Durante minha carreira, trabalhei em multinacionais no Brasil, países da América Latina, Espanha, Porto Rico, Emirados Árabes Unidos e Qatar. Em meu tempo livre, sou um grande entusiasta do ciclismo em seus diversos modos, incluindo o cicloturismo.
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