Ao olhar para os aspectos da relação entre as redes 5G em implantação no Brasil e os sistemas de comunicação via satélite, a primeira coisa que pensamos é a relação de conflito que estamos vivenciando entre essas tecnologias.
Os sistemas de transmissão satelitais que prestam serviço de TVRO (Television Receive Only), a famosa TV parabólica, ocupa parte da faixa destinada ao 5G. Veja na figura abaixo essa sobreposição de frequências:
Espectro de frequências 5G SA – Fonte: Arquivo Pessoal
Esse trabalho de migração está acontecendo e a primeira rede 5G foi ativada há duas semanas em Brasília – DF. Além disso existem as estações de transmissão satelitais FSS (Fixed Satellite Services) que também usam essa faixa de frequência e estão recebendo filtros para mitigar qualquer interferência.
Apesar de todas essas questões, vamos ver aqui nesse artigo como essas duas tecnologias podem se tornar grandes aliadas na expansão da cobertura do 5G.
Quando penso em comunicações via satélite, dois números me vem à cabeça: 35.786 e 500. Um satélite posicionado na órbita que se encontra o cinturão de Clarke à exatos 35.786km consegue girar a uma velocidade angular da terra o que faz ele ser geoestacionário, ou seja parado em relação a um ponto na terra. Essa viagem da informação desde o transmissor até o satélite e depois ao endpoint pode incrementar um atraso na entrega dos pacotes de até 500 ms e entregar uma experiência de uso muito ruim para o usuário final.
Então por que dizer que os satélites podem ajudar o 5G?
Porque não existem satélites somente a essa órbita geoestacionária. Já existem satélites orbitando em volta da terra a distâncias menores. Como nessas órbitas inferiores eles estão sempre se movendo, a solução para manter uma área iluminada é ter uma constelação de satélites. Quanto mais baixa a órbita maior o movimento porém menor o delay:
Órbitas satelitais – Fonte: 5G Americas
Constelações de satélites LEO (Low Earth Orbit) podem entregar latências de 50ms o que é aceitável para muitos casos de uso. Em outros vários casos amparados por IoT, que fazem medições esporádicas de parâmetros ou geolocalizam ativos sem requisitos de ser em tempo real, delays acima de 125 ms são aceitáveis.
Por exemplo: se eu quero monitorar a localização em tempo real de um veículo entre a saída da fábrica e a chegada na concessionária, a informação em real time, ou seja, envio da localização a cada segundo não seja necessária e sim a cada 10 minutos até que se detecte um desvio de rota e o equipamento passe a mandar a cada minuto. Mas ainda nesse caso um sistema satelital com delay alto atende.
Voltando para o 5G, existem diversas maneiras das redes satelitais contribuírem com a expansão do 5G:
- Servindo como backhaul para expansão da rede: para cobrir uma área remota com 5G não basta apenas ir lá e instalar uma antena. É necessário fazer essa torre se comunicar com a rede. E em áreas remotas como fazendas, rodovias e povoados afastados essa conexão pode ser via satélite.
Torre celular em área remota – Fonte: satcompost
- Servindo como backhaul backup: em uma segunda ou terceira abordagem de backhaul a uma Node B (antena) que não pode perder conexão com a rede. Por exemplo uma torre que atenda uma delegacia de polícia, hospital, fábrica, etc.
- Prover conectividade a dispositivos dentro de navios, trens ou aviões: apesar de estarem em movimento, constelações de satélites podem ser usadas como backhaul para proporcionar conectividade 5G para os passageiros.
- Atuar como mais uma antena 5G: hoje dispositivos mais robustos já se conectam a redes de voz dados celular via satélite como por exemplo o Iridium, Spot, Garmin. Por que não usar essas antenas como cobertura direta do 5G. Algo semelhante ao que se especula estar sendo feito pela Tesla com a sua rede Starlink e o celular modelo Pi.
Todas alternativas são interessantes para que as constelações satelitais ajudem na implantação e ampliação da cobertura do 5G. O que vai ditar o uso? ROI e viabilidade técnica para cada caso prático.
Conseguimos clarear a possível relação entre 5G e satélites nesse artigo? Ficaria feliz em discutir, te ajudar pelos comentários ou numa mensagem de Inbox.
Sou Mauro Periquito, Engenheiro de Telecomunicações e Associate Partner na Kyndryl, onde desenvolvo e gerencio projetos de transformação digital para indústria, utilities, mineração, agronegócio e operadoras de telecomunicações. Em minha trajetória profissional tenho como propósito traduzir as necessidades dos clientes em soluções customizadas.
Também atuo em outras frentes como mentor, palestrante, conselheiro consultivo e escrevo diariamente no LinkedIn sobre gestão de pessoas, carreira, inovação e tecnologia, com a missão de trazer uma visão descomplicada sobre a tecnologia.
Durante minha carreira trabalhei em multinacionais no Brasil, países da América Latina, Espanha, Porto Rico, Emirados Árabes Unidos e Qatar. Em meu tempo livre, sou um grande entusiasta do ciclismo em seus diversos modos incluindo o cicloturismo.
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